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Rafaela

O meu nome é Rafaela.

Partilho hoje a minha história, porque foi exatamente há um ano que ouvi e vi o Afonso pela primeira vez.

No dia 27 de novembro de 2023, fiz uma primeira ecografia, após um teste positivo, confirmando a gravidez com 6 semanas de gestação.

Foi um momento mágico. Foi o momento mais feliz da minha vida até hoje. Tenho um pequeno vídeo dessa ecografia e do coraçãozinho dele a bater, praticamente inaudível, mas que encosto ao meu ouvido para de alguma forma me transportar para aquele momento. E como
eu gostaria de voltar! De saber que estava tudo bem, que o meu bebé ainda estava comigo… Até dia 09 de janeiro de 2024, senti-me a mulher mais feliz do mundo, nunca senti tanto amor, nunca senti que tudo fazia tanto sentido!

Contudo, no dia 09 de janeiro de 2024, na ecografia do 1º trimestre, alguns marcadores apontaram para a existência de algum tipo de anomalia/trissomia. Foi um momento aterrador. Ainda há pouco o tinha visto pela segunda vez, em dezembro, com 9 semanas, e estava
tudo bem. Como é que agora me dizem que o meu bebé pode não estar bem?! Que devo fazer um exame para confirmar? Que existe o risco de o perder?!

A partir desse dia, a minha vida nunca mais foi a mesma. Tudo aconteceu muito rápido a seguir… A probabilidade de trissomia 21 era de 1 em 4, o que era bastante elevado. Eu tinha 29 anos e o pai, 28, e não, não tínhamos nenhum grau de parentesco (esta foi uma pergunta que na altura nos foi feita). O risco de trissomia 13 era também relativamente elevado, de 1 em 28.

Para confirmar o diagnóstico, como o meu bebé tinha apenas 12 semanas, não podia fazer uma amniocentese. Então, no dia 16 de janeiro, fizemos uma biópsia das vilosidades coriónicas. A biópsia das vilosidades coriónicas é, como a amniocentese, um procedimento
invasivo e consiste na colheita de fragmentos da placenta (onde se situam as vilosidades coriónicas) que contêm material genético idêntico ao do bebé. Estava muito nervosa.

Apesar de ser bastante reduzido, existia sempre risco de abortamento e estava com muito medo de o perder ali. Perante as circunstâncias, correu muito bem e, após realizaram o procedimento, a médica verificou os batimentos do bebé. Eu não sabia nesse dia, mas foi nessa data a última vez que ouvi o seu coração bater…

No dia 18 de janeiro, soubemos o resultado deste exame, confirmando-se a trissomia 21. Olhando para trás, foram poucos dias entre dia 09 e dia 18, mas confesso que me pareceu uma eternidade, em que, a cada dia, eu morria um bocadinho… Não sabia se havia de ter esperança, porque a probabilidade até estava a nosso favor (3 em 4) ou se havia de me mentalizar que não estava tudo bem (1 em 4). E, de repente, a confirmação de que realmente não estava tudo bem… Foi nesse momento que o meu mundo desabou.

Eu e o pai do meu bebé tínhamos conversado sobre esta possibilidade e, para nós, não fazia sentido trazer ao mundo uma criança com esta condição. Em primeiro lugar, porque o mundo não está preparado para aceitar a diferença. Em segundo, porque não sabíamos exatamente
que problemas de saúde estariam associados e ainda qual o grau de trissomia. Em terceiro, porque, a nosso ver, não teríamos condições para poder prestar o tipo de cuidados que uma criança com necessidades especiais merece e precisa. A interrupção médica da gravidez (IMG) era uma possibilidade e foi a nossa escolha. Na altura, foi muito difícil, mas foi a minha/nossa decisão…

Olhando para trás, novamente, foi tudo muito rápido mesmo e, independentemente de outras questões, agradeço ao hospital por isso. Isto, porque, a cada semana, o bebé evolui rapidamente e pensei que, quanto mais adiasse, maior seria a dor, se é que a dor de perder um filho se pode medir… Enfim, às vezes (ou muitas vezes), questiono-me sobre esta decisão, sinto culpa, penso que escolhi matar o meu filho… Tento lembrar-me que foi uma escolha por amor.

Foi uma escolha num contexto que não escolhi. Foi uma escolha
condicionada e nenhuma mãe/pai deveria ser confrontada com a decisão da vida ou da morte do seu próprio filho.

Mas assim foi… No dia 24 de janeiro de 2024, o Afonso nasceu e partiu. Com ele partiu também a pessoa que eu era até então. Não consigo deixar de sentir dor quando penso nesse dia e, ao mesmo tempo, um amor imensurável.

Na altura não fui capaz de expressar a vontade que tinha de pegar no Afonso. Essa opção também não me foi apresentada… E o momento em si roubou de mim todas as capacidades que me restavam para o pedir. A culpa também aparece por isso. Gostava tanto de ter pegado nele e não fui capaz de o verbalizar.

Não me despedi do Afonso como queria e gostava que me tivessem dado essa opção. Por mais pequenino que fosse, com 14 semanas e 2 dias, o meu colo era seu e não lho dei. Às vezes, revivo esse dia, imagino-o no meu colo… E fico mais em paz.

Só recentemente percebi que, por mais doloroso que tenha sido esse dia, escolheria sempre vivê-lo a nunca ter tido o Afonso. Foi curta a sua existência, demasiado curta, mas escolheria sempre tê-lo, apesar de saber o final da sua história…

Ainda estou a aprender a dar um novo significado à perda do Afonso. Estou a aprender quem sou eu agora e para onde vou. Penso que a dor nunca vai desaparecer, mas sinto que, aos poucos, vai doendo cada vez menos. A dor dá lugar ao amor. Um amor sem limites.

Um amor incondicional. E penso que foi mesmo isso que o Afonso me veio ensinar. O verdadeiro significado de amor. Tenho aprendido muito sobre isso e sobre tanto… Sobre mim, sobre as pessoas, sobre o luto, sobre a dor… Sobre apreciar a natureza, reparar nas flores, ver borboletas brancas vezes sem conta, ouvir os pássaros. Sobre apreciar a vida e a sorte que tenho pela minha própria existência. Sobre apreciar cada momento e celebrar pequenas vitórias. Agradeço ao Afonso por isto e por tanto…

A nossa história começou ainda antes do teste de gravidez positivo do dia 9 de novembro de 2023. Começou nos meus sonhos em ser mãe, em construir uma família…

Hoje, sou a mãe do Afonso e ele será sempre o meu primeiro filho. E sempre que dizem o nome dele, sempre que falam sobre ele, o meu coração fica quentinho e sinto-me feliz. Deixo aqui também um apelo a isso – digam o nome dos nossos filhos, por favor.

Eles existiram, mesmo que não os tenham visto, nós vimo-los e/ou sentimo-los… Eles existiram… E nosso amor por eles nunca deixará de existir!

Partilho esta história também, porque me lembro de, naqueles dias de janeiro, procurar outras histórias que me dessem algum “conforto”, para não sentir que estava sozinha nesta dor… E encontrei um testemunho no site do “Amor para além da lua” sobre IMG e trissomia 21. Li e reli vezes sem conta esse testemunho. Ainda o leio, às vezes, para sentir que não estou sozinha, para ter algum “colo” e sentir mais paz na minha escolha.

Lembro-me também de procurar histórias de mães que ficaram sozinhas, sem companheiro, depois da perda. E queria dizer que esta é uma dessas histórias. Duas semanas após a IMG, o pai do Afonso decidiu abandonar-me e deixou-me sozinha na nossa casa… Conto isto apenas para que, se alguém como eu procurar uma dessas histórias, essa pessoa saber que não está sozinha. Sim, isto acontece, é um pesadelo a dobrar, mas acontece. É viver o luto de um filho e, ao mesmo tempo, o luto de um relacionamento.

Nem sempre lidamos com a dor da melhor forma e os momentos mais dolorosos e desafiantes da nossa vida vêm exatamente mostrar-nos quem está verdadeiramente do nosso lado, quem verdadeiramente nos ama… E eu não fiquei sozinha, ainda que, muitas vezes, não me sentisse suficientemente compreendida, tive familiares e amigos que me deram (e dão) a mão. E serei eternamente grata por isso.

Neste caminho, também encontrei conforto e acolhimento em grupos de apoio à perda gestacional/neonatal e ainda na minha psicóloga,
a quem estou igualmente grata…

E, acima de tudo, estou muito grata por poder ter vivido a breve vida do Afonso que viverá para sempre em mim. É um amor sem fim.

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Ana Marina R.

Hoje quero deixar o meu testemunho aqui, na esperança de confortar um pouco o coração de alguém!

Sei que quando navegamos por águas agitadas a tempestade parece não ter fim à vista, tive dias em que o barco naufragou e eu me senti tão exausta de nadar contra a força das ondas que senti que a qualquer momento ia perder a força na braçada e me ia deixar afogar.

Mas hoje agradeço por cada dia que cai e levantei, pela resiliência que sempre alimentei pelo amor e o desejo de ser mãe.

Em 2020 decidimos que queríamos ser pais. Por motivos de trabalho, cometemos o erro de adiar o início das tentativas quase um ano.

Hoje, digo-vos, nunca adiem os vossos desejos, por motivos que não sejam de força maior… Adormeci muitos dias arrependida de o ter feito!

Em Julho de 2022, descobri que estava grávida, estávamos a tentar esta gravidez já há algum tempo e ficamos super felizes! Senti-me maravilhosa por saber que tinha um ser a crescer dentro de mim…

Na primeira consulta com o obstetra ouvi o que nunca vou esquecer “lamento, mas não está a evoluir bem”: tínhamos uma gravidez não evolutiva, um aborto retido.

Precisei de ir para a maternidade induzir a expulsão e, sinceramente, foi das coisas mais terríveis que passei: ver cair na sanita, o que deveria ser o meu filho a crescer no meu útero.

A dor física foi grande, mas a psicológica foi difícil de suportar… A verdade é que, até ao dia do suposto nascimento deste bebé, o meu sofrimento era grande, não conseguia ver grávidas, nem bebes pequeninos sem chorar.

A frustração de começar tudo de novo, a incerteza de saber se algum dia iríamos conseguir…

Mas, assim que possível começamos logo a tentar de novo. No entanto, eu sentia que psicologicamente estava em baixo e acabei por procurar uma médica de acupuntura especialista em fertilidade que foi a minha sorte grande!

Melhorei bastante a nível psicológico e consegui regular bastante o meu ciclo. Três meses depois (junho 2023) estava novamente grávida.

Mas…tive uma perda de sangue e verificou-se outro aborto, desta vez com suspeita de não ter implantado bem. Não desistimos, e no ciclo seguinte, eu estava novamente grávida, mais uma perda de sangue, várias idas à maternidade, e mais um aborto espontâneo (Agosto de 2023).

Nesta altura, apesar de devastada, senti que iríamos dar outro passo, porque ao terceiro aborto seríamos encaminhados para a maternidade para fazer o estudo do nosso caso. Sinceramente, neste momento, nós já só queríamos uma resposta, uma solução!

Informei-me e infelizmente as consultas estavam a demorar cerca de 6 meses. Não queríamos esperar tanto tempo, mas estávamos desesperados com o facto de podermos voltar a abortar.

Decidimos então procurar um especialista em fertilidade, com a esperança de podermos começar a analisar alguma coisa enquanto não éramos chamados para o estudo da maternidade. O médico achou que eu poderia ter uma inflamação numa trompa e medicou-me, depois poderia voltar a tentar.

Em novembro, descobrimos uma nova gravidez e, só quem passa pelo mesmo, percebe o medo que se sente neste momento. A felicidade típica desta fase dá lugar ao desespero de conseguirmos manter este bebé. Confesso que achei que iria abortar de novo, mas a minha princesa resistiu…(pelo tratamento à trompa, pela aspirina que entretanto estava a tomar ou porque o universo assim desejou).

Em dezembro o nosso médico suspeitou na eco de uma alteração genética, que acabou por não se verificar. Em janeiro, suspeitou-se de um problema no intestino que também acabou por desaparecer. Pensava todos dias que desta vez não me recuperava se algo viesse a não correr bem.

À minha volta todos queriam saber o sexo, eu só queria saber se estava tudo bem, e as semanas entre consultas eram uma contagem decrescente.

Confesso que não consegui viver a gravidez de forma normal, o medo acompanhou-me sempre. Gerar uma vida é tremendamente empoderador, mas muitos dias não o consegui sentir dessa forma… É duro, não minto, senti muita vez que me tiraram o direito a viver a maternidade em pleno.

Em Fevereiro fui chamada para o estudo do hospital, entretanto verificou-se que eu tinha trombofilia, e foi necessário levar injeções diárias.

A minha filha nasceu às 38+4 de parto normal, depois de 3 dias em indução por causa do fluxo do cordão não estar a 100%, foi mais um teste à minha resiliência e à capacidade de suportar a dor, porque o meu útero não queria colaborar.

Mas graças à minha força, às equipas maravilhosas da maternidade BB que se cruzaram comigo, e ao companheiro sempre incansável que tenho a meu lado a nossa pequenina nasceu saudável e cheia de força de viver.

Esperámos tanto por ela e finalmente termos a nossa riqueza nos braços é verdadeiramente o melhor do mundo (mesmo cheia de olheiras e com 3h de sono).

Como a minha avó dizia “Não há mal que sempre dure, nem bem que nunca chegue!” Não desistam!

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Deborah

Quando me casei em 2007 queria engravidar rápido, mas não consegui. Por 3 anos tentamos naturalmente até procurar ajuda médica. Foram muitos os exames até chegar à conclusão que uma tuba uterina estava totalmente obstruída.

A médica disse que a chance da outra adoecer e obstruir também era muito grande e deu-nos a opção de uma FIV, o que estava fora da nossa realidade. O procedimento e medicação são muitos caros. Aconteceu em 2014 se eu não estiver enganada e seguimos na luta sem conseguir engravidar naturalmente. Fui atrás de conseguir uma vaga pelo SUS na Unicamp para tentar alguma solução na infertilidade.

A fila é bem grande e, para minha surpresa, no ano de 2020, consegui a vaga e começamos a tratar e seguir para cirurgia para tentar desobstruir as trompas. Foi um milagre: as trompas estavam perfeitas…Tenho exame de imagem, mostrando a trompa obstruída e eu creio foi Deus que me curou.

Seguimos na tentativa com coito programado e nada. Depois de um tempo fizemos uma inseminação e nada, depois de mais um tempo outra e nada.

Depois de 4 anos nessa luta muito desgastante psicologicamente e financeira, porque pagava pela medicação e não é barato….eu e o meu esposo decidimos desistir do tratamento e entramos no processo de adoção. Em menos de 1 ano, acredite, eu engravidei naturalmente, e, infelizmente perdi o bebe com 10 semanas, mas ascendeu uma esperança de ter meu bebê da barriga era meu sonho e fizemos mais uma inseminação e engravidei de uma menina.

Nasceu prematura extrema com 27 semanas porque tive muitas complicações de saúde e uma trombose descoberta só às 25 semanas. As medicações não faziam mais tanto efeito a minha pressão subiu  muito, nada controlava tive embolia pulmonar fui para a UTI 3x e, por fim, os médicos decidiram interromper minha gravidez para eu não morrer e a neném também…

Ela nasceu com 675 gramas e ficou 4 meses na UTI neonatologia. Enfrentou muitos desafios, mas venceu pela Glória de Deus e está hoje linda com 1 ano e 3 meses!

Digo que para Deus não existe impossível! Ela realiza desejos do coração ❤️ não desista do seu sonho de ser mãe!

Glória a Deus pela vida !!

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Joana e Miguel

Tenho vindo a partilhar a nossa história com muitas pessoas, família, amigos, conhecidos do Instagram, mas senti necessidade de a fazer chegar a mais pessoas.

Não sei se por mim, se por ti que estás a ler, ou se por alguém que, ainda sem coragem de ler sobre o assunto, um dia chegue aqui.

A nossa história começou em 2019. Conheci o homem com quem tive de imediato a certeza que casaria e teria filhos. Fiz logo todas as análises de pré concepção. Como tinha tirado um ovário aos 18 anos, por ter um quisto significativamente grande, queria garantir que, quando quiséssemos ser pais, porque o se aqui não estava em questão, tudo estaria ok para isso.

E assim foi. Em junho de 2022 casámos. Foi o melhor dia das nossas vidas, felicidade essa que acreditamos que nem um filho trará. Este é o nosso sonho, esta pessoa que temos ao nosso lado.

Deixei de tomar a pílula no dia do nosso casamento, completamente inconsciente, a meio de uma caixa! Passei a lua de mel toda no vai, não vai de menstruação, mas sem stress. Tínhamos tempo! 

Desde sempre que achei que seria difícil engravidar. Apesar de todos os médicos dizerem que não era um problema, eu acreditava que só com um ovário as coisas seriam mais difíceis.

Setembro de 2022 o nosso primeiro positivo. Não fiquei radiante! Disse logo ao meu marido para que não ficasse super feliz, porque era bom de mais para ser verdade.

Fomos à ecografia às 7 semanas. Saco gestacional no sítio, mas apenas de 5 semanas. “Pode acontecer.”, dizia a médica,”teremos de repetir daqui a 15 dias para ver se há evolução”.

Decidimos contar aos pais e irmãos, já com a consciência de que poderia não evoluir. E assim foi. Em novembro confirmámos: gravidez anembreonaria, temos de provocar o aborto.

Optámos por fazer a medicação em casa dos meus sogros. Sabíamos que ia ser doloroso e não queríamos guardar recordações desse momento em nossa casa.

Correu tudo bem, expulsei no próprio dia, e bola para a frente.

Março de 2023 estava grávida outra vez. Nem queríamos acreditar. Era desta!!!

28 de março, o meu dia de anos, uma terça feira! Acordei, fui trabalhar, sem saber que seria o pior dia da minha vida, da nossa vida.

Por volta das 11h deu-me uma dor que me tirou todas as forças. Corri para o WC e nada. Zero!

Chamei a diretora da escola onde trabalho (sim, sou educadora de infância) e esta ligou de imediato ao meu marido. Nem 5 segundos e lá estava ele. Ele e a ambulância atrás de si.

Fomos para o CMIN, tinha sido seguida lá na interrupção da 1a gravidez.

Fazemos ecografia à chegada. Nada, nem saco, nem embrião, nem líquido. “Como sabe que está grávida?” pergunta a médica que nos recebeu nas urgências. “Fiz um teste e deu positivo!” “Ah, então são sabe se está grávida mesmo” responde a médica. (OBVIAMENTE QUE ESTOU GRÁVIDA!!!)

Chamam outros médicos para ver a eco. Um médico, não nos lembramos do nome diz “se tem teste positivo, está grávida! Mas realmente muito estranho, nada se vê nem se encontra.”

Pedem para ficar por perto que vou fazer análises e demora cerca de 2 horas até termos os resultados. (Atenção que ainda estamos no meu dia de anos)

Eu, o meu marido e a minha mãe, lá ficámos. Encontrámos amigos, rimos de tudo aquilo e continuámos com a mesa do jantar de anos marcada.

Por volta das 14h tenho uma quebra de tensão enorme, aparece a enfermeira e levam-nos para nova ecografia. Muito líquido solto. Voltam a chamar muitos médicos, gravidez ectopica é o mais provável. Mais pessoas começam a chegar, pai, irmão, sogros que estavam cá para festejar o meu aniversário, etc…

“Mas o que é isso? Vão me tirar o que tenho aqui? Nem pensem, não deixo. Não têm a certeza? Descubram, mas ninguém me abre.”

“Tem a certeza? Sabe que pode morrer? Tem de assinar um consentimento a dizer que não quer intervenção.” E eu assinei! Isto sem o meu marido ao meu lado, “porque o marido tem de ficar no lado do computador….”

Lá passaram as horas, dor forte no ombro esquerdo, hemorragia interna brutal, operação de urgência…. Tudo acabou bem. O embrião ficou no coto da trompa que tirei aos 18 anos. O lado “bom” continua funcional para continuarmos a tentar de forma espontânea. Ufa! Bola para a frente outra vez!

Fomos a especialistas, clínica Alberto Barros, Porto clínica, … “São azares, vocês engravidam, continuem a tentar”. “Umas análises hormonais podem fazer…” 

Antimulleriana (reserva ovárica) 0,17, muito baixa, “mas a verdade é que engravidam, continuem a tentar.” E assim fizemos.

Agosto de 2023 grávida outra vez.

Descobrimos numa ida às urgências no hospital de Abrantes, por outros motivos e nem quisemos acreditar. “É desta, à terceira é de vez!” dizíamos nós a toda a gente!

Fizemos ecografia na maternidade de Abrantes e nada, apenas líquido no fundo do saco. Beta positivo, historial de gravidez ectopica, digo que costumo ter ascite e então “Vamos fazer uma punção para perceber o que é este líquido.”

E lá se confirmou. Não era sangue, respirámos de alívio. Era desta, tínhamos a certeza.

Repetimos ecografia e beta na semana seguinte. Beta a descer, continua sem se ver nada ecografia. Infelizmente não deixaram o meu marido entrar. Ouço coisas do “género” (ponho género para não chocar, pois foi literal o que eu ouvi) “isto? Isto é infertilidade. Este ovário é miserável. É uma inconsciente por estar a tentar de forma natural, está a pôr a sua vida em risco, nunca vai ser mãe de forma natural.”

Caiu-me o mundo, todo! Sozinha naquela sala com o médico (se se pode chamar médico a essa pessoa) e com a enfermeira, que estava branca, sem qualquer reação. Saí daquela sala sem verter uma lágrima. Esperei entrar no elevador para dizer ao meu marido “nunca seremos pais de forma natural, sou infértil”. O meu marido ficou possuído, queria entrar por lá a dentro e desfazer aquele senhor, mas optámos por fazer uma queixa à ordem dos médicos e assim foi.

Voltámos para o Porto, aos nossos médicos de referência, fizemos estudo genético, mais mil analises, tudo ok. Sem qualquer incompatibilidade. Bola para a frente, mais uma vez.

Conhecemos o nosso novo médico nos Lusíadas, que nos referenciou para o CMIN e começámos a ser seguidos lá. Fizemos os exames todos, comecei a tomar tromalyt, poderia ajudar.

Falaram-me no Ponto de Fertilidade, a quem devo muito, lá comecei eu a acupuntura, desta vez estava decidida a fazer tudo o que estava ao meu alcance.

Ficámos 7 meses em que não conseguimos engravidar. Chorava quase todos os dias. Já tinhamos passado por muito, 3 abortos, 7 meses de tentativas sem sucesso. Finalmente referenciados para PMA fomos a uma consulta, não ficámos satisfeitos com o que nos ofereciam, mais os tempos de espera.

A nossa médica de família e a minha psicóloga, a quem devo toda a minha sanidade, acharam que seria bom eu tirar uns tempos, ficar de baixa, descansar, tratar de mim, de nós. E assim foi.

“Não queríamos acreditar! Era um milagre!”

Fomos a mais umas clínicas no Porto. Ouvimos coisas como “o seu ovário está adormecido, provavelmente não irá funcionar este mês. O ideal é ovodoação.” Ok, conformados, aceitamos e decidimos “vamos avançar para tratamento. Vamos a Vigo! Falam tão bem de Vigo, que é lá que vamos” (sem querer desvalorizar todos os médicos que tínhamos em Portugal até agora).

Encontramos uma médica na IVI, a quem lhe agradecemos a calma que trouxe aos nossos corações. “O ovário está ótimo, funciona perfeitamente, tem aqui um folículo que rebentou ou vai rebentar, ainda podem engravidar naturalmente este mês.”

Maio 2024, esperava ansiosamente a menstruação para começar a estimulação para FIV, e esta nunca mais chegou. Atrasou um dia, dois dias, e eu não aceitava. Fomos para Cristelo, para estar mais perto de Vigo, com as injeções atrás (se alguém precisar, ou souber a quem eu possa doar, tenho as injeções no frigorífico e não vou utilizar), e continuava sem chegar. Acreditava que era a minha cabeça a atrasar todo o processo. O meu marido dizia que era bom sinal, mas eu não acreditava.

Tinha um teste em casa, mas não o quis fazer, não queria gastar dinheiro. Até que uma amiga, médica, me liga e pergunta como está a correr o tratamento. Quando lhe conto o que se está a passar ela “obriga-me” a ir fazer um beta. Deu positivo, 80 e qualquer coisa… Não queríamos acreditar!!! Era um milagre! “Impossível. Como assim agora? É desta! Não há como, é o destino!”

Fizemos beta de semana em semana, ecografia de 15 em 15 dias, vesícula vitelina, depois embrião, depois coração… É desta!!! Só pode ser.

Às 11 semanas fazemos as análises do 1o trimestre. Uma médica amiga pergunta se queremos fazer uma eco para confirmar as 11 semanas e fazer o trust, e nós pensámos “porque não?”

Embrião ainda de 10 semanas, é normal, mas… Translucência nucal aumentada. A médica tenta suavizar “é sinal de anomalia, mas é muito cedo, pode ser do crescimento, pode desaparecer”.

Às 13 semanas, estamos em Madrid de férias, um ligeiro sangramento. Não sabemos se podemos voltar pois estamos de carro e o repouso poderia ser o mais indicado. Vamos às urgências. Hospital La Paz. Pessoas incríveis e nós confiantes de que seria apenas mais um susto.

Ecografia, bebe sem batimentos, o nosso chão desaparece. Abraçamos, choramos, ouvimos a médica. Voltámos para o Porto. O nosso bebe morreu. O nosso primeiro bebe.

Ligámos aos nossos médicos, fomos diretos para o CMIN onde já estavam à nossa espera e onde nos explicaram todo o processo e nos garantiram que seríamos bem acompanhados. 

A minha psicóloga recebeu-me de urgência nessa noite.

Voltámos no dia seguinte para iniciar a medicação da indução do aborto, horas que nunca mais passavam, dores que não são possíveis de descrever e naquele caos penso: “amor para além da lua, eu preciso de partilhar a nossa história, eu preciso que acreditem que é possível e que acontece”. Enviei uma mensagem nesse dia, nesse momento. Eu precisava disso.

O meu marido não me largou um segundo, a minha mãe, o meu pai, os meus irmãos, os meus sogros, os meus cunhados, as nossas famílias e amigos, todos sempre connosco.

O nosso bebe saiu. 4 centímetros de gente. Com tudo. Pernas, braços, mãos, olhos, tudo. 4 centímetros de gente. O nosso primeiro bebe.

Despedimo-nos dele, despedimo-nos da maternidade no dia seguinte, despedimo-nos de mais uma luta, mais um desafio, com o coração cheio de todos os profissionais que nos acompanharam, de todos os amigos, família, conhecidos, etc etc etc. de toda a gente que se emociona com a nossa história e acredita em nós.

Despedimo-nos do nosso bebe com a certeza que foi ele que nos fez acreditar, foi ele que nos fez confiar e é ele que um dia vai dar vida aos seus irmãos.

Sabemos disso, temos a certeza disso. E queremos que tu também tenhas, tu que nos lês! E finalmente, bola para a frente, mais vez…

Joana e Miguel

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L.

Pensei mil vezes se partilharia a minha experiência.
Talvez por ser ainda fresco, talvez por não querer reviver tudo.
Mas acredito também que possa ajudar alguém com a minha partilha.

Dia 17 de fevereiro, após 8 meses de tentativa, descubro que estou grávida do meu segundo filho.

Ficámos extasiados porque era muito desejado e eu amei o meu filho desde os dois trocos no teste de gravidez.

Sonhei com o futuro, sonhei com o poder dar um irmão ao mais velho, aniei pelas dificuldades de ter dois também.

Dia 19 de Março vejo um corrimento acastanhado.
Corri para as urgências da MAC onde me disseram que tanto poderia ser aborto como não ser. Assim, só. Sem mais detalhes, aconselhamento, acompanhamento. Estaria de 8 semanas.

O meu mundo, o nosso, desabou.

Uma semana depois marquei eco no particular porque a ansiedade era muita.

Estava tudo ok. 9 semanas e sem perceberem a razão do corrimento.

Às 10 semanas tive a eco com a obstetra. Batimento cardíaco e desenvolvimento normal. Gravidez evolutiva, disseram.

Às 11 semanas e 3 dias o corrimento passou para sangue vivo. Urgências de novo.
Sem batimento cardíaco: “Vá para casa para expulsar. Há de ter umas dores típicas menstruais”.

Morri ali um bocadinho. Morremos. Chorei.
Dois dias depois comecei a ter dores horríveis. Não de menstruação, mas contrações horríveis. Tremores, suores, hemorragia intensa, muito choro junto. Até sentir que o meu filho saiu de mim.

Não percebo até hoje a falta de acompanhamento que tive a nível clinico.
Não percebo como resumem tudo a ” daqui a dois meses tenta de novo”.

Acabei de perder o meu bebé, o meu sonho, um pedaço de mim e do meu amor.

Ainda hoje dói e ainda hoje sinto que tudo foi surreal, como se me visse de fora a viver isto tudo.

A todas as mulheres que passam por isto em silêncio, porque ainda é tabu, porque é desvalorizado, muita força.

De uma coisa estou certa, seremos sempre mães destes bebés que não pegámos no colo. ❤️

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Olena

Eu queria partilhar a minha história. 

Ainda me dói e eu quero falar sobre o nosso “biscoitinho” … 

Ainda quero gritar para o mundo e dizer que o nosso biscoitinho estava vivo…

estava dentro de mim..

e tão amado por nós, pai e mãe. 

Era minha segunda gravidez perdida…Duas seguidas – na primeira foi um aborto espontâneo às 6 semanas.

Na segunda vez já foi com muita dor.. Aconteceu muito recentemente, no dia 25 de março 2024.

Estávamos tão felizes e queríamos ver como tu estavas no primeira eco, eu estava já com 13 semanas. Eu já tinha ouvido teu coração antes na semana 8 e estava tudo bem. Tu fizeste algumas danças dentro de mim e depois começou a nossa viagem! Eu estava tão feliz!

Eu e teu pai falávamos contigo todos dias, já imaginávamos como serias. O teu pai não queria saber se eras menina ou menino, queria uma surpresa. 

Na semana 11 de minha gravidez, acordei e não sentia as minhas mamas. Assustei-me muito.

Mas claro que sempre tinha esperança e não pensava que poderia perder o meu feto, o nosso biscoitinho. Tinha uma consulta no centro de saúde com o médico de família. Ele dizia que “Tudo bem, é normal não sentir mamas…vai correr tudo bem”

No dia 25 de março, tínhamos marcado uma eco às 8:30 de manhã. Acordei esta noite com um pesadelo que tinha sangue nos meus cuecas … Fui à casa de banho e no papel vi um pouco cor de rosa…

O meu coração já sentia que alguma coisa não corria bem.

Mas ainda não imaginava.

No eco, apanhei uma médica muito doce e humana. Ela começou mexer e tocar minha barriga com mais força…

Depois dizia “Infelizmente, não tenho boas notícias”. Vou lembrar esta frase sempre …

Uma Gravidez – não evolutiva: parou na semana 11 …

Chorei muito. Chorámos. Não lembro-me muito bem este dia…

Fomos ao parque e sentámos numa pedra.. Estava sol e quentinho e os nossos com corações estavam partidos. Eu tive um grande apoio do meu marido. Nós passámos juntos este processo todo.

No dia seguinte, tivemos consulta com uma médica – que parecia um “robot”. Falou comigo como se eu fosse “um armário” e o meu feto morto dentro de mim não fosse nada. Era uma pedrinha ou qualquer coisa que ela achava. Eu chorei muito.

Deram-me um medicamento, disseram que preciso voltar no dia seguinte, fazer expulsão no hospital e tomar mais um medicamento. A enfermeira disse-me que seria muito pouco provável acontecer alguma coisa nessa noite. O meu marido perguntou o que poderia fazer e se iria acontecer em casa. A doutora disse que podíamos apanhar o feto numa caixa plástica para levar depois ao hospital (ela queria fazer exame de estudo do feto).

Em casa, quando fomos dormir, eu já sentia algumas espasmos e tomei ibuprofeno.

Acordei às 3 de manhã com dores.

Tomei benuron, não funcionou.

Às 3:30 de manhã já começou um processo muito triste e difícil.. Senti muitas contrações, fortes. Lembro-me que não sentia as minhas orelhas, tudo no meu corpo doía, queria vomitar. O meu marido acordou e eu já gritava tanto. 

A médica não me explicou o processo, eu não sabia nada sobre isto…

Só vi um pouco no internet. Vi que tem sair o feto e depois a placenta…

Tive um parto na caso de banho em minha casa, com uma caixa plástica preparada perto de mim ..

Eu vi e senti que a água começou a sair, depois eu vi outra “coisa”. Não percebi logo que era o meu biscoitinho…saiu. Apanhei-o no caixa, não sei como. Mas apanhei.

Tentei ver o que estava dentro de caixa. Vi uma mão e dedos pequeninos.. Do meu biscoitinho. Gritei tanto.

Dez minutos depois começou grande dor e contrações. Devia ser a placenta a sair… Saiu uma grande coisa com sangue de tamanho como minhas duas mãos. Depois logo me senti melhor… Acabou às 4:30 da manhã. 

Meu querido marido tentou vestir-me para me levar ao hospital.

Mas eu não conseguia parar o processo. Já começou, já precisava acabar. Explorar meu feto, o nosso amor e o nosso sonho.

Fomos para hospital. As pessoas que estavam lá não nos receberam bem. A enfermeira gritou comigo.

Fizeram eco, já estava tudo limpo, não precisava nenhuma cirurgia.

Fizeram um vacina de imunoglobulina ( estou RH negativa , meu marido RH positivo) e fizeram também um shot de Diclofenaco. Eu senti-me logo melhor.

Fomos vazios. Em casa dormi muito. Chorei muito. Chorámos muito. Falamos sobre o biscoitinho, muito. Lembramos muito. Meu marido disse “EU AMO-TE muito meu Biscoitinho”. Nunca nos vamos esquecer de ti!

Depois senti mais 2-3 dias muitas dores físicas, depois muitas dores psicológicas… 

Uma semana depois, estava no autocarro onde eu estava antes com o meu biscoitinho e chorei muito. Queria cantar para toda gente que estava no autocarro que o meu biscoitinho já morreu. Eu estou já não igual como estava na semana passada no mesmo autocarro com mesmas pessoas. 

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Ana Rita F.

Apareceste-me num sonho e uns meses depois tornaste-te a nossa realidade.

Recebemos a notícia da tua existência como uma bênção e, embora o medo e a ansiedade tomassem conta de mim, agarrei-me a ti com todas as forças.

No dia em que recebemos a notícia de que não tinhas conseguido, o mundo desabou novamente e o teu papá mais uma vez foi o pilar.

Desculpa, meu amor, por não ter a força que todos esperavam. Não consegui ainda contar aos manos.

Já todos te amamos tanto que dói demais deixar-te ir… Queria ter fé, queria ser forte, queria tanto que tu conseguisses, por ti, por nós…

Fica o tempo que precisares, serei sempre a tua casa, e por mais anos que viva, tu viverás em mim.

Hoje ainda não aceito, talvez não aceite nunca… a dor essa vai doer sempre, mesmo que me digam que todos os dias vai doer menos um bocadinho. Eu tenho a certeza que não… a dor vai estar sempre cá, a mamã é que vai aprender a lidar com ela e a camuflar com um sorriso, pelos manos, pelo papá e pela tua memória…

Obrigada por teres feito de mim casa, por me teres escolhido, e embora não te carregue no colo, irei carregar-te sempre no coração.

Dois no colo, 5 no coração!

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Catarina A.

No dia 15 de fevereiro de 2022 descobri que estava grávida. Um bebé planeado e desejado sendo que não podíamos estar mais felizes. No entanto, sou da área da saúde e como sei que muita coisa pode não correr/estar bem mantive sempre alguma ansiedade até à ecografia do 1° trimestre.

Esta ecografia confirmou os meus receios e apesar da ecografia em si estar bem, os valores do rastreio bioquímico estavam muito altos havendo alta possibilidade de alguma síndrome. Fomos aconselhados a realizar a colheita para dna fetal que para nossa grande alegria veio normal e descansou os nossos corações. Até à segunda ecografia. Uma malformação. Fizemos amniocentese e ficamos de repetir novamente a ecografia. Mais uma nova malformação. E finalmente o resultado da amniocentese que confirmou o nosso maior receio.

O coração do meu Tomás parou dia 8 de Julho e o seu parto foi no dia 9 de julho de 2022. Os dois dias mais difíceis da minha vida. Assim como os seguintes em que tudo parecia cinzento e as lágrimas caiam umas atrás das outras de forma incessante.

Escrevo hoje com a minha bebé arco-íris nos braços para recordar o meu Tomás. A dor melhora mas nunca desaparece e o Tomás está no meu coração todos os dias e nunca será esquecido. O meu filho mais velho.

No entanto, deixo uma mensagem de esperança a quem está neste momento a passar por algo semelhante. Melhores dias virão e os vossos corações serão eventualmente apaziguados. Os dias de sol eventualmente serão em maior número que os cinzentos. E nos nossos corações ficarão a memória e a saudade. Para sempre.

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Joana A.

Desde que me conheço que digo: tenho três sonhos na minha vida: casar, ir à Índia e ser mãe. Os dois primeiros já realizados e com a felicidade de poder dizer: realizados com o homem da minha vida.

Eu sou a Joana, tenho 33 anos e venho-vos contar a minha história! Porque todas as histórias aqui lidas me ajudaram e por isso sinto, que posso e devo ajudar outras mulheres e homens.

Em Outubro de 2022, decidimos que íamos ser pais. Um filho não se compra num supermercado, como sabiamente uma grande e querida amiga me disse uma vez. Por isso a decisão de ser pais, começa com a intenção de o ser, e esperar para ver, se a vida tem este capítulo escrito na história das nossas vidas, importa aqui saber, que sempre senti que este seria
o sonho que me traria algumas dificuldades em realizar. Nesta altura descobrimos que teríamos de esperar 6 meses, derivado de um contratempo. Chorei muito, mas acreditei que a espera me queria dizer alguma coisa.

Passados os seis meses, sem pressas e sem ansiedade, começámos as nossas tentativas. Em Junho de 2023, dia 14, descobrimos o nosso positivo! Muitos enjoos, impossibilidade de trabalhar, não conseguia perceber se estava feliz ou extremamente chateada por não conseguir
estar a usufruir da vida a crescer dentro de mim! O nosso filho! Fizemos a primeira ecografia às 7 semanas, ouvimos o coração forte e pela primeira vez uma luz muito grande invadiu todo o meu corpo. Os dias foram passando, contámos a muito poucas pessoas, os nossos pais souberam, pois eu vomitava dia e noite, e para tranquilizá-los contámos a verdade. A quem contámos, sempre dissemos: “calma, é muito cedo e pode não dar certo.” Dizíamos sempre isto, porque, na verdade, tínhamos os pés bem assentes na terra. Temos dentro do nosso círculo de amigos, amigos estes que são a família que escolhemos, que passaram por duas perdas gestacionais até terem o menino que tem sempre uma palavra bonita para nos dizer.

A história deles sempre me comoveu bastante, pela força, resiliência e o amor entre os dois. Quando fizemos as 12 semanas de gestação, senti que um peso me tinha saído de cima, e pensava, não perdi o meu filho, mas logo de seguida começou a ansiedade, será que está tudo bem? Tínhamos a ecografia marcada das 12 semanas, mas, nesse dia, foi greve dos médicos e
ficou remarcada para dois dias depois. Mas quis a vida que, nesse dia de manhã, tivesse um corrimento ligeiramente cor-de-rosa, que me deixou em alerta, e por tal motivo decidimos após o trabalho (enjoos tinham melhorado bastante por volta das 11 semanas), ir à urgência saber se
estava tudo bem.

No hospital, a médica (sempre querida), fez uma primeira análise e disse que não tinha sangue e o colo do útero estava fechadinho, mas que iriamos fazer na mesma uma eco. O meu coração acalmou. Ao deitar na maca e ao colocar o ecógrafo na minha barriga, não se via nada…comecei a tremer e a médica justificou que o ecógrafo da urgência não era o melhor do mundo, pelo que teríamos que fazer eco endovaginal. Quando começou, o ecrã virado para mim, percebi logo que o tamanho não seria de um bebé de 12 semanas e expressei isso mesmo.

Antes de me dizerem a mim alguma coisa, disse eu: “o bebé é muito pequeno para 12 semanas não é?” e a médica respondeu: “oh Joana, não tenho boas notícias, temos um bebé com medição de 9 semanas e 5 dias e não encontro batimentos”… não chorei, não disse nada, veio outra médica confirmar o que já tinha sido dito. Só pedi para o meu marido entrar e assim foi. Aborto retido. Não foi aborto espontâneo, como achei durante 12 semanas que poderia acontecer. Apenas nesse dia, muito já noite fora, é que chorei e comecei a questionar: mas porquê?

Fiz a medicação em casa para a expulsão. Os piores momentos da minha vida até ao dia de hoje. Muito sangue, muitas dores, e o momento que senti que era sem dúvida o saco gestacional, com o meu filho, a ser expulso. Grata ao mundo pelo homem maravilhoso que tenho ao meu lado que nunca me deixou desamparada. Se ele pudesse, eu sei, que sem hesitar
teria trocado comigo.

Passados 4 dias voltei ao hospital, ainda tinha restos ovulares, mas já sem o saco, sem o meu filho… fiz novamente medicação para ajudar a sair o restante e ajudou (mas pouco). Fomos de férias, para tentar ultrapassar o que nos tinha acontecido. Não era esquecer, porque nunca vamos esquecer que um ser me escolheu para ser casa durante 12 semanas, nos quais quase 10 o seu minúsculo coração bateu dentro de mim.

Infelizmente, quis a vida que os meus restos ovulares saíssem apenas quase 3 meses depois da notícia da perda. Foram longos 3 meses, com dores diárias, sangramento diário, e um tentar diário que tudo está bem e vai ficar bem. Nunca escondi a ninguém o que me aconteceu.

Sou a primeira a querer contar, e sei que é preciso coragem para tal. Mas precisamos de normalizar a perda. A gravidez está longe de ser igual às novelas, as histórias todas bonitas e românticas que vemos nos filmes. Uma em cada quatro mulheres que engravidam, passam por isto. Umas mais cedo, outras mais tarde, outras depois das 12 semanas e todas sofrem. Umas mais, outras menos, mas sofrem. Até as que escolhem interromper a gravidez por vontade própria. É um processo doloroso e está longe de ser normal, como nos querem fazer acreditar.

Vou ser eternamente grata, ao meu primeiro filho, por me ter ensinado tanto, mesmo sem nunca o ter sentido nos meus braços, no meu colo.
Agora, é seguir em frente e esperar por algo que sinto e sei: o meu filho vai voltar e eu vou tê-lo nos meus braços, ver crescer e ensinar-lhe todos os dias: com amor, tudo vale a pena!

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Claudia F

No dia 18 de junho, o meu mundo desmoronou mais uma vez. Eu que estava tão feliz com o meu arco-íris, meu sonhado bebé, que já estava aqui comigo três meses.

Mais uma vez soube que essa gravidez não poderia ir mais para a frente, pois o teu coraçãozinho já não batia mais. Eu te amo e te amei tanto meu filho enquanto estiveste aqui, obrigada por me ter escolhido para ser tua casa nesses 3 meses mais felizes da minha vida.

Que um dia Deus me possa fazer vivenciar isso de novo, mas dessa vez até ao fim, até ter-te aqui nos meus braços para a vida toda.

Ninguém nunca entende a mulher que passa pelo luto do aborto e ninguém nunca irá entender até realmente passar.

Nessa fase todos viram médicos, todos acham que sabem o que dizer. Mas, na verdade, não há nada que possa ser dito, não há nada que supere a dor de perda de uma mãe.

Sim, já me considero mãe, mesmo que não tenhas nascido. Considero-me mãe desde o primeiro positivo, dos dois tracinhos, do “grávida mais de 3 semanas”. Ouvir o teu coraçãozinho pela primeira vez foi a sensação mais bonita e única da minha vida toda. E a minha maior ansiedade era quando que voltaria a ouvir esse coração que, embora tão pequeno, já tinha mudado muito dentro de mim.

Só tenho a agradecer-te, minha estrela mais brilhante, agradecer-te por tudo! Obrigada por me fazer presenciar e sentir um dos sentimentos mais puros do mundo. Por pouco tempo que tenha sido, tenho muito a agradecer.

Talvez nesse momento da minha vida questione até Deus. Não porque a minha fé foi abalada, mas sim porque não entendo: Porquê comigo? O que foi que eu fiz? Será que o meu problema é grave? E porque sinto a dor da revolta. E acho que nesse momento está tudo bem em revoltar-me. Acho que tenho mais a agradecer do que reclamar, mas nesse momento não sei o que agradecer.

Só sei que a dor que carrego é tão grande, só eu sinto. Só sei que a cruz tem ficado cada vez mais pesada para eu carregar. E pergunto-me até quando irei suportar tudo isso.

As minhas lágrimas são a minha única forma de expressar a minha dor, e como dói , dói na alma, dor essa que nenhuma mulher deveria sentir.

Por favor: Guarda-me senhor como a menina dos teus olhos.

Deus me faça forte, porque te adorar é o que me mantém de pé.