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Raquel

Hospital muito confuso, em contentores. Tiro senha para ginecologia e obstetrícia e fui para uma grande sala de espera. Chamam-me e vou para lá com pressa, por não saber onde era e com medo de chegar atrasada.

Ainda tive de aguardar algum tempo para entrar, mas entretanto sou chamada à enfermagem e faço todos os procedimentos, e informam-me dos riscos por não ser imune à toxoplasmose. Volto para a pequena sala de espera e poucos minutos depois sou chamada para o gabinete da médica. 

Tirei a parte inferior da roupa e começamos a ecografia, ainda não era a de 1° trimestre, mas sim para ver se estava tudo bem. 

Mal vi o bebé, o primeiro pensamento foi logo de orgulho “o meu bebé cresceu tanto!”. A última vez que o tinha visto tinha sido às 8 semanas e no dia 19 de Outubro, faria as 10 semanas.

No entanto, reparei que a médica ficou muito calada e, mal me apercebi disso, ouço das piores coisas que já ouvi na vida “lamento, mas tenho más notícias para si… O bebé está morto, não tem batimentos cardíacos”. O tempo parou durante uns segundos e fui sentindo um aperto cada vez maior, como se todo o meu mundo estivesse a desabar.. 

A médica chamou uma colega para confirmar o diagnóstico e não teve dúvidas. Enquanto a médica me explica as partes do corpo do bebé e onde o coração deveria estar a bater, sinto as lágrimas a chegar aos meus olhos, mas ao mesmo tempo tento segura-las. Tinha de ser forte ali, quando fosse embora choraria tudo o que teria de chorar. 

Mas, infelizmente, ainda faltava um bom bocado para ir embora… Depois da ecografia, sentei-me com a médica, e explicou-me quais seriam os procedimentos seguintes, que teria de ser internada para que o aborto fosse completo (fiz um aborto retido).

lamento, mas tenho más notícias para si…

Depois de tudo explicado, começou logo o primeiro problema, a médica não conseguia passar a baixa médica, por não ter todos os dados actualizados no centro de saúde, obrigando-me a ter de ir lá para ter uma consulta e atualizar o necessário, para poder fazer o meu luto e ter o meu descanso durante 28 dias. Para além disso, para ser admitida na Obstetrícia no dia seguinte teria ainda de fazer um teste COVID.

Por último, tinha ainda de tomar um comprimido já, para preparar para o dia seguinte, mas como já não comia nada no espaço de 2h, mandaram-me ir comer qualquer coisa e regressar para tomar o comprimido. Assim o fiz. Fui comer umas bolachas de máquina vending mais próxima e voltei para a sala de espera da obstetrícia, rodeada de grávidas e eu a pensar no meu pequenino, que não conseguiu sobreviver, enquanto as mulheres ao meu lado estariam perto de ter um filho/a nos braços. Inveja e tristeza, foi o que senti nesses minutos.

Pouco tempo depois (que a mim me pareceu muito), uma auxiliar vem com o tal comprimido e depois de o ter tomado diz que tenho de fazer o teste COVID, num outro edifício (e eu sem conhecer o espaço visto ser a minha primeira vez lá). Não sei se foi a minha profunda tristeza ou a minha cara de ignorante enquanto ela me explicava o caminho, mas aí uma outra auxiliar disse “eu levo-a lá”. Como estava sozinha, perguntou-me várias vezes se tinha alguém para me levar embora, se precisava de alguma coisa e tentou animar-me durante o caminho todo, mas sem sucesso. Eu só lhe dizia “eu só quero ir embora”. 

Quando chegamos ao local, ela fez questão em aguardar por mim, caso eu precisasse dela. 

O médico que me fez o teste foi pouco afável, mas profissional. Depois de terminado, lá estava a auxiliar à minha espera e perguntou-me se precisava de alguma coisa enquanto voltávamos para o local inicial. Disse -lhe que a médica não conseguia passar a baixa a partir do próprio dia por não ter os dados, mas que em princípio não precisava de uma justificação de falta ao trabalho porque no dia seguinte ma passaria no internamento. A auxiliar disse-me que poderia precisar e pediu me para aguardar no exterior e que iria pedir uma justificação num instante para que eu pudesse ir embora. Foi extremamente rápida e em pouco tempo já estava a caminho do meu carro, para poder ligar ao meu namorado e a minha mãe e dar-lhes a notícia. Não sei o nome dela, mas ela foi a melhor profissional que me atendeu no hospital da cidade, sítio que nunca irei querer voltar para o resto da minha vida.

Finalmente saí das instalações e liguei primeiro a minha mãe, onde só conseguia dizer “o bebé está morto! Morreu!” no meio de tanto choro e soluço. Pouco mais consegui dizer e liguei depois ao meu namorado. Pouco mais lhe consegui dizer também, mas ele apenas me disse, muito prontamente: “onde estás? Fica aí, vou ter contigo”.

Enquanto aguardava por ele no carro, só pensei em me conter durante uns minutos, só para poder informar no trabalho que já não iria trabalhar no próximo mês, a partir do dia em questão e o motivo. Liguei a uma das minhas supervisoras, disse lhe que iria ser extremamente breve por não saber se conseguia aguentar mais tempo ao telefone e expliquei lhe tudo muito resumido, mas com tudo o que precisava de saber. Garanti-lhe que não precisava que alguém fosse ter comigo, o meu namorado já estava a caminho.

De casa até ao parque de estacionamento onde estava, ainda são uns 10/15 minutos, mas acho que ele fez isso em metade do tempo, porque pouco depois de ter acabado a chamada ele apareceu. Só me lembro de chorar abraçada a ele para libertar algum do peso que tinha em cima.

Ele, sendo a melhor pessoa do mundo para mim, só me dizia, “vamos conseguir. Nós somos fortes. Vamos ter lindos filhos. Vamos ultrapassar isto.” Nunca duvidei disso.

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