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Telma O.

Vou falar-vos da Francisca, a luz da minha vida.
Eu e o pai decidimos que em Setembro de 2021 seria uma boa altura para começarmos a tentar engravidar. E foi, de facto, uma boa altura.
A 7 de Novembro veio a boa notícia: a Francisca já estava dentro de mim.

No dia seguinte fomos ao médico e fizemos ecografia que confirmou: lá estava um pequeno saquinho com 5 semanas.

Eu estava cheia de medo, insegurança, receio. Sempre a achar que na próxima ecografia nos diriam algo que não queríamos ouvir. Aquele medo de mãe.

Mas o tempo foi passando, e às 8 semanas ouvimos o coração daquele bebé tão desejado.

Às 12 semanas, a ecografia morfológica confirmou que estava tudo bem e a nossa bebé (ainda sem sabermos que era uma menina) seguia forte.

De três em três semanas lá íamos nós ao nosso médico e lá estava ela, a mexer-se muito. E o médico dizia isto a cada consulta: “Vai ser comprida como o pai”. O pai mede 1,93m.

Em Fevereiro de 2022, ao contrário do que eu previa, é-nos dito que vinha aí uma menina. Não tinha nome, só tínhamos nome para menino…

Até que o pai, um dia, olha para mim e diz “vai chamar se Francisca”. Fomos ver o significado e dizia “francesa livre”. E o pai é francês. Então sem dúvida ficou o nome decidido, Francisca.

O tempo foi passando, a barriga cresceu, a alegria e felicidade também. E aí comecei a crer que sim, que já não ia acontecer nada, que a nossa Francisca tinha vindo para ficar.

No fim de Maio, numa ecografia morfológica, dizem-nos que a Francisca era magrinha e comprida, que a mãe devia repousar mais.

Calhou bem, pois só nessa semana eu tinha acabado de preparar as roupas.

E eu cumpri. De 15 em 15 dias lá íamos nos ver da Francisca e ela engordava mas muito pouco.

Até que, três semanas antes do seu nascimento, comecei a senti-la cada vez menos. Supostamente estava tudo bem, diziam os médicos. Mas eu sentia que não.

Quando ma deram nos braços para me despedir, soltou o único som que lhe havíamos ouvido nos seus poucos 5 dias. Conheceu-me, eu sei que sim.

Entre idas à urgência e a certeza dada que tudo estava bem, entro em trabalho de parto que se revelou muito rápido, rápido demais.

A Francisca não aguentou as contrações porque afinal tinha uma restrição de crescimento grave.
Tudo nela era pequeno, a placenta, o cordão. Menos ela: media 53cm.

No trabalho de parto, entrou em sofrimento e ficou privada de oxigénio.
Por isso, nasceu de uma cesariana improvisada, no meio do caos.
Foi reanimada 5 vezes e internada no Hospital Pediátrico de forma a se conseguir controlar os danos. Mas os danos eram irreparáveis.

A RM confirmou: a Francisca não tinha atividade cerebral e só o ventilador a mantinha ligada a nós.

Então, num dia quente de domingo, cinco dias depois da nossa luz ter vindo ao mundo, decidimos desligar o suporte de vida.

Quando ma deram nos braços para me despedir, soltou o único som que lhe havíamos ouvido nos seus poucos 5 dias.
Conheceu-me, eu sei que sim.

Nove meses de amor não se esquecem assim.

E assim, nos braços do seu querido pai, a Francisca esteve sem ventilação uns breves 40 minutos (porque nós queríamos e tínhamos uma vida inteira) e adormeceu na morte.

Gravei o seu toque, o seu cheiro. Fecho os olhos e sinto a sua essência. Beijei-a muito, mexi-lhe nas bochechas. A nossa bonequinha era a coisa mais linda que alguma vez tínhamos conhecido.

Há coisas duras na vida. Mas decidir desligar o ventilador de uma filha recém-nascida não tem descrição.

E agora, 4 semanas depois, estamos a tentar sobreviver. Sem ela, a luz da nossa vida.

A esperança não morreu. A vontade também não. Eu hei-de continuar a ser mãe, o pai há-de continuar a ser pai. E a benção de um irmão para a Francisca há-de chegar.

O nosso foco irá mudar, se isso acontecer. Mas para onde olharmos, onde está um, poderiam estar dois, onde estão dois poderiam estar três. Porque a Francisca é eterna nos nossos corações. Fez de nós pais e se tiver irmãos, vai ser falada e dada a conhecer.

Esta história nunca será de alegria. Espero vir um dia dizer-vos que foi uma história de superação, de resiliência, de coragem. Mas se há coisa que esta história foi, foi de amor. Um amor imensurável, terno e doce como nunca antes havíamos experienciado.

Foi isso que tu vieste trazer ao nosso mundo Francisca: amor. Até um dia, minha bonequinha. É um soninho. Até já.

Quanto às mães e pais que também viram o seu bebé adormecer na morte: não estão sozinhos. Estamos juntos. Amanhã será um dia melhor. 

Um comentário a “Telma O.”

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