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M.G

Posso resumir a minha história… em 2006 tive o meu primeiro bebé. Eduardo de seu nome, nasceu parto normal pélvico com 37+5, no dia 15 de outubro. Mas nasceu morto. Morreu nesse domingo de manhã. Pouco tempo depois em 2008 nasceu a primeira bebé arco-íris!

Mafalda nasceu dia 20 de junho às 38+1 por cesariana e correu tudo bem. Uma adolescente traquina e maravilhosa como todos os nossos filhos. Agora, em 2023, nasceu a Margarida em 09 de Agosto com 39 semanas e por cesariana. Uma gravidez com anemia, diabetes e pré-eclâmpsia.

A Margarida nasceu e, assim que saiu dentro de mim, passado uns horríveis 45 minutos vieram dizer que ela é deficiente visual. Caiu tudo ao chão.

A Margarida tem duas doenças raras e uma delas causou mal formação ocular e ela é cega. Hoje com 8 meses não é fácil aceitar.

É um luto por não ter a filha perfeita e tão desejada. Mas à nossa maneira tentamos fazer com que ela seja o mais feliz possível.

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Testemunhos Testemunhos Interrupção Médica da Gravidez

Ana Patrícia F.

Para o meu bebé


Descobrimos a gravidez dia 28 de novembro de 2023. Foi o dia mais feliz da minha vida.

Desde então os meus olhos irradiavam felicidade. A 18 de dezembro ouvimos pela primeira vez o teu pequeno coraçãozinho e tinhas como DPP 18/08/2024.

Anunciamos a gravidez à família na noite de Natal e tudo corria bem até ao dia 8 de fevereiro em que, numa ecografia de rotina detectaram um problema no teu coraçãozinho e depois de vários exames veio o diagnóstico “Triploidia – Incompatível com a vida”.

Lembro-me do desespero de nada poder fazer para ficar contigo. Achei que seria um pesadelo, mas não era.

Interrompi a gravidez dia 20/02/2024 com 14 semanas e 2 dias. Nasceste às 21h30. Foi o pior dia da minha vida. Desde então sinto um vazio e uma angústia que poucos entendem.

Só quem passa sabe do que falo. Para os outros não existes mas para mim exististe e existirás para sempre.

Continuas a ser o nosso bebé, o nosso primeiro bebé. Lembro-me de ti a toda a hora. O tempo passa e a saudade aumenta. Ficarás infinitamente no meu coração e serás para sempre o nosso primeiro filho.

Fui a pessoa mais feliz do mundo enquanto te tive só para mim, dentro de mim onde ninguém te faria mal. Agora olho para o céu e vejo-te na estrela mais brilhante. Sei que estás a olhar por nós.

Amo-te daqui ao infinito, meu bebé.

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L.

Pensei mil vezes se partilharia a minha experiência.
Talvez por ser ainda fresco, talvez por não querer reviver tudo.
Mas acredito também que possa ajudar alguém com a minha partilha.

Dia 17 de fevereiro, após 8 meses de tentativa, descubro que estou grávida do meu segundo filho.

Ficámos extasiados porque era muito desejado e eu amei o meu filho desde os dois trocos no teste de gravidez.

Sonhei com o futuro, sonhei com o poder dar um irmão ao mais velho, aniei pelas dificuldades de ter dois também.

Dia 19 de Março vejo um corrimento acastanhado.
Corri para as urgências da MAC onde me disseram que tanto poderia ser aborto como não ser. Assim, só. Sem mais detalhes, aconselhamento, acompanhamento. Estaria de 8 semanas.

O meu mundo, o nosso, desabou.

Uma semana depois marquei eco no particular porque a ansiedade era muita.

Estava tudo ok. 9 semanas e sem perceberem a razão do corrimento.

Às 10 semanas tive a eco com a obstetra. Batimento cardíaco e desenvolvimento normal. Gravidez evolutiva, disseram.

Às 11 semanas e 3 dias o corrimento passou para sangue vivo. Urgências de novo.
Sem batimento cardíaco: “Vá para casa para expulsar. Há de ter umas dores típicas menstruais”.

Morri ali um bocadinho. Morremos. Chorei.
Dois dias depois comecei a ter dores horríveis. Não de menstruação, mas contrações horríveis. Tremores, suores, hemorragia intensa, muito choro junto. Até sentir que o meu filho saiu de mim.

Não percebo até hoje a falta de acompanhamento que tive a nível clinico.
Não percebo como resumem tudo a ” daqui a dois meses tenta de novo”.

Acabei de perder o meu bebé, o meu sonho, um pedaço de mim e do meu amor.

Ainda hoje dói e ainda hoje sinto que tudo foi surreal, como se me visse de fora a viver isto tudo.

A todas as mulheres que passam por isto em silêncio, porque ainda é tabu, porque é desvalorizado, muita força.

De uma coisa estou certa, seremos sempre mães destes bebés que não pegámos no colo. ❤️

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Mariana C.

(15-12-2023) Olá. Sou a Mariana, tenho 29 anos e sonho ser mãe desde que me lembro gente.

Sempre sonhei ser mãe. Sempre. Tenho memórias, do alto dos meus 5 anos, de ter sempre todas as bonecas grávidas, preenchia-lhes a barriga com pedacinhos de papel. Ou eu própria, punha uma almofada debaixo da camisola. Dava biberão, mudava fraldas, dava banho, embalava, punha a dormir, eles “choravam”, lá ia eu …

Cresci. Tinha 23 anos quando engravidei pela primeira vez. Não era o plano na altura, tinha ido morar sozinha, começado a trabalhar e engravidei. Fiquei em êxtase! Estava grávida! Mesmo a morrer de medo, a morrer de tudo, transbordava, transpirava alegria. Mas foi sol de pouca dura. Mais tarde venho a descobrir que havia 99.9% de chance de vir a ser uma pessoa (o bebé) muito doente, e tive de tomar a decisão que, até hoje, foi a pior da minha vida, travar aquela gravidez e assinar por isso. Não basta tudo, ainda temos de assinar um papelinho, “assine na linha abaixo, pf”.

Morri por dentro. Senti-me morta muito tempo, mesmo muito.

Até que conheço o meu marido. Depois de andar um ano a deambular existência (a minha), conheci-o. E foi por esta história que começamos. Ele ajudou-me, ajudou-me imenso a aceitar aquele aborto. Um ano depois, ainda chorava nos braços dele como se tivesse sido ontem. Passaram meses, muitos meses, até que fosse capaz de voltar a sorrir com a alma e coração, mas consegui! Consegui e conseguimos.

Ironia do destino, ou não, mal sabíamos o que nos esperava.

Decidimos então abrir portas a tentar o nosso próprio bebé. E conseguimos! Uns meses mais tarde, estava grávida. O que eu saltei de alegria! Mas durou pouco. Às 6 semanas comecei a sangrar, urgências, anembrionária. Não podia ser possível… Como era possível?! Era. Mais uns meses de profunda escuridão.

Quase um ano depois, continuava sem engravidar. Fomos a uma clínica, N exames, diagnóstico: endometriose!

Mas como podia ser possível?! De repente, parecia um ataque direto, uma guerra aberta ao maior, quase único, sonho da minha vida: ser mãe.

Avançamos para FIV. Transferimos 2 embriões. Ambos nidaram, estávamos grávidos! Vinham 2 bebés! Não… Não vieram. Nem 2 nem 1 nem nenhum. Aborto espontâneo, estava de poucas semanas.

Aqui, honestamente, quase acreditei em bruxaria, não era normal. Não podia ser normal, de certeza que tinha sido escolhida por Deus.

Em baixo, mesmo muito em baixo, vivia o mês dos meus anos e o período não vinha. De certeza que era do aborto dos gémeos. Era normal atrasar. Nunca tinha abortado de 2 por isso, de certeza que era normal um atraso de duas semanas. Não. Estava grávida!

Engravidei logo no mês da perda dos gémeos. Naturalmente. Depois da punção, da transferência, depois de tudo, ali vinha ela! A nossa menina, a Mel!

Medo. Os sentimentos dominantes eram medo e angústia. Sempre angustiada. Sempre. Não tive um único dia de paz. Sentia e achava sempre que ia acabar mal. E o tempo foi passando… 8 semanas, 10 semanas, 12 semanas, é uma menina, 14 semanas, 16 semanas… “Há qualquer coisa no coração dela, mãe”. Hum?! O que é “qualquer coisa”?

Entramos numa pescadinha de rabo na boca. Hospital, ecografias, médicos, vários, diferentes, hospital, ecografias, fomos de férias! Ou íamos morrer de nervos e ansiedade e de tudo, precisávamos de desanuviar. Fomos. E foram as piores férias das nossas vidas.

Senti-me mal, mas mal, mal ao ponto que ainda hoje tenho dificuldade em explicar. Deixei de comer, beber, dormir, ter forças nas pernas, senti que tinha morrido por dentro, literalmente. Senti. Eu sabia. Eu sabia… Hospital. Ecografia. Sozinha, porque estávamos em pandemia. Silêncio. 3 minutos de ecografo na barriga, eu olhava fixamente para o teto enquanto sentia a angústia da médica no ar, a quantidade de vezes que ela olhou para mim, em busca do meu eye contact, mas eu não queria! Porque sabia… Sabia-o. E perguntei (mantendo os olhos no teto) “então doutora? Tudo bem?”. Ela: não… Não Mariana… O coração da sua bebé parou. Não me mexi. Levei as mãos ao peito e senti alívio! Respirei o último fôlego de alívio, antes de cair na depressão profunda, mas o primeiro desde os últimos 6 meses. A minha filha estava livre. Livre do sofrimento em que tinha entrado. Estava em paz, sem vida, dentro de mim, mas em paz. Minha filha, minha bebé. E foi a vez do meu coração parar.

Deprimi. Deprimi, mas não parei. 3 meses depois fui operada a uma endometriose, “das piores já vistas” pela minha médica. Perdi intestino, outras partes de órgãos, mais de duas dezenas de focos, foi de tal ordem que poderia perder a capacidade de engravidar naturalmente e perdi.

(18-4-2024) Mais processos de PMA, FIV, punção, transferências. Mais perdas! Mais falhanços. Até Julho de 2023. Último embrião, probabilidade quase nula. Foi por descargo de consciência e voilá, positivo! Mas sem festejos. Sem nada. Quase toda a gravidez sem acreditar. Cheia de medo, muitos sustos, muita medicação, muito hospital, médicos e N opiniões. Foram 38 semanas e 3 dias. 38 semanas e 3 dias do amor mais profundo, do mais bonito, do mais intenso, do que carrega baterias de forma ímpar, do melhor do mundo, o meu filho, o Afonso. Meu perfeito, amado e desejado filho. Chegou dia 3 de abril e com ele veio a paz e o acalmar do coração que mais precisava: sou mãe, do ser mais belo do universo.

Esta comunidade, Amor para além da Lua, deu-me luz, deu-me esperança, deu-me o que mais nada deu pelas corajosas partilhas de outras mães. Hoje, espero que seja o meu testemunho a dar luz a alguém.

Com todo o amor para além da lua, a ti, filha.
Com todo o amor do mundo, a ti, filho.

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Olena

Eu queria partilhar a minha história. 

Ainda me dói e eu quero falar sobre o nosso “biscoitinho” … 

Ainda quero gritar para o mundo e dizer que o nosso biscoitinho estava vivo…

estava dentro de mim..

e tão amado por nós, pai e mãe. 

Era minha segunda gravidez perdida…Duas seguidas – na primeira foi um aborto espontâneo às 6 semanas.

Na segunda vez já foi com muita dor.. Aconteceu muito recentemente, no dia 25 de março 2024.

Estávamos tão felizes e queríamos ver como tu estavas no primeira eco, eu estava já com 13 semanas. Eu já tinha ouvido teu coração antes na semana 8 e estava tudo bem. Tu fizeste algumas danças dentro de mim e depois começou a nossa viagem! Eu estava tão feliz!

Eu e teu pai falávamos contigo todos dias, já imaginávamos como serias. O teu pai não queria saber se eras menina ou menino, queria uma surpresa. 

Na semana 11 de minha gravidez, acordei e não sentia as minhas mamas. Assustei-me muito.

Mas claro que sempre tinha esperança e não pensava que poderia perder o meu feto, o nosso biscoitinho. Tinha uma consulta no centro de saúde com o médico de família. Ele dizia que “Tudo bem, é normal não sentir mamas…vai correr tudo bem”

No dia 25 de março, tínhamos marcado uma eco às 8:30 de manhã. Acordei esta noite com um pesadelo que tinha sangue nos meus cuecas … Fui à casa de banho e no papel vi um pouco cor de rosa…

O meu coração já sentia que alguma coisa não corria bem.

Mas ainda não imaginava.

No eco, apanhei uma médica muito doce e humana. Ela começou mexer e tocar minha barriga com mais força…

Depois dizia “Infelizmente, não tenho boas notícias”. Vou lembrar esta frase sempre …

Uma Gravidez – não evolutiva: parou na semana 11 …

Chorei muito. Chorámos. Não lembro-me muito bem este dia…

Fomos ao parque e sentámos numa pedra.. Estava sol e quentinho e os nossos com corações estavam partidos. Eu tive um grande apoio do meu marido. Nós passámos juntos este processo todo.

No dia seguinte, tivemos consulta com uma médica – que parecia um “robot”. Falou comigo como se eu fosse “um armário” e o meu feto morto dentro de mim não fosse nada. Era uma pedrinha ou qualquer coisa que ela achava. Eu chorei muito.

Deram-me um medicamento, disseram que preciso voltar no dia seguinte, fazer expulsão no hospital e tomar mais um medicamento. A enfermeira disse-me que seria muito pouco provável acontecer alguma coisa nessa noite. O meu marido perguntou o que poderia fazer e se iria acontecer em casa. A doutora disse que podíamos apanhar o feto numa caixa plástica para levar depois ao hospital (ela queria fazer exame de estudo do feto).

Em casa, quando fomos dormir, eu já sentia algumas espasmos e tomei ibuprofeno.

Acordei às 3 de manhã com dores.

Tomei benuron, não funcionou.

Às 3:30 de manhã já começou um processo muito triste e difícil.. Senti muitas contrações, fortes. Lembro-me que não sentia as minhas orelhas, tudo no meu corpo doía, queria vomitar. O meu marido acordou e eu já gritava tanto. 

A médica não me explicou o processo, eu não sabia nada sobre isto…

Só vi um pouco no internet. Vi que tem sair o feto e depois a placenta…

Tive um parto na caso de banho em minha casa, com uma caixa plástica preparada perto de mim ..

Eu vi e senti que a água começou a sair, depois eu vi outra “coisa”. Não percebi logo que era o meu biscoitinho…saiu. Apanhei-o no caixa, não sei como. Mas apanhei.

Tentei ver o que estava dentro de caixa. Vi uma mão e dedos pequeninos.. Do meu biscoitinho. Gritei tanto.

Dez minutos depois começou grande dor e contrações. Devia ser a placenta a sair… Saiu uma grande coisa com sangue de tamanho como minhas duas mãos. Depois logo me senti melhor… Acabou às 4:30 da manhã. 

Meu querido marido tentou vestir-me para me levar ao hospital.

Mas eu não conseguia parar o processo. Já começou, já precisava acabar. Explorar meu feto, o nosso amor e o nosso sonho.

Fomos para hospital. As pessoas que estavam lá não nos receberam bem. A enfermeira gritou comigo.

Fizeram eco, já estava tudo limpo, não precisava nenhuma cirurgia.

Fizeram um vacina de imunoglobulina ( estou RH negativa , meu marido RH positivo) e fizeram também um shot de Diclofenaco. Eu senti-me logo melhor.

Fomos vazios. Em casa dormi muito. Chorei muito. Chorámos muito. Falamos sobre o biscoitinho, muito. Lembramos muito. Meu marido disse “EU AMO-TE muito meu Biscoitinho”. Nunca nos vamos esquecer de ti!

Depois senti mais 2-3 dias muitas dores físicas, depois muitas dores psicológicas… 

Uma semana depois, estava no autocarro onde eu estava antes com o meu biscoitinho e chorei muito. Queria cantar para toda gente que estava no autocarro que o meu biscoitinho já morreu. Eu estou já não igual como estava na semana passada no mesmo autocarro com mesmas pessoas. 

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Ana Rita F.

Apareceste-me num sonho e uns meses depois tornaste-te a nossa realidade.

Recebemos a notícia da tua existência como uma bênção e, embora o medo e a ansiedade tomassem conta de mim, agarrei-me a ti com todas as forças.

No dia em que recebemos a notícia de que não tinhas conseguido, o mundo desabou novamente e o teu papá mais uma vez foi o pilar.

Desculpa, meu amor, por não ter a força que todos esperavam. Não consegui ainda contar aos manos.

Já todos te amamos tanto que dói demais deixar-te ir… Queria ter fé, queria ser forte, queria tanto que tu conseguisses, por ti, por nós…

Fica o tempo que precisares, serei sempre a tua casa, e por mais anos que viva, tu viverás em mim.

Hoje ainda não aceito, talvez não aceite nunca… a dor essa vai doer sempre, mesmo que me digam que todos os dias vai doer menos um bocadinho. Eu tenho a certeza que não… a dor vai estar sempre cá, a mamã é que vai aprender a lidar com ela e a camuflar com um sorriso, pelos manos, pelo papá e pela tua memória…

Obrigada por teres feito de mim casa, por me teres escolhido, e embora não te carregue no colo, irei carregar-te sempre no coração.

Dois no colo, 5 no coração!

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Catarina A.

No dia 15 de fevereiro de 2022 descobri que estava grávida. Um bebé planeado e desejado sendo que não podíamos estar mais felizes. No entanto, sou da área da saúde e como sei que muita coisa pode não correr/estar bem mantive sempre alguma ansiedade até à ecografia do 1° trimestre.

Esta ecografia confirmou os meus receios e apesar da ecografia em si estar bem, os valores do rastreio bioquímico estavam muito altos havendo alta possibilidade de alguma síndrome. Fomos aconselhados a realizar a colheita para dna fetal que para nossa grande alegria veio normal e descansou os nossos corações. Até à segunda ecografia. Uma malformação. Fizemos amniocentese e ficamos de repetir novamente a ecografia. Mais uma nova malformação. E finalmente o resultado da amniocentese que confirmou o nosso maior receio.

O coração do meu Tomás parou dia 8 de Julho e o seu parto foi no dia 9 de julho de 2022. Os dois dias mais difíceis da minha vida. Assim como os seguintes em que tudo parecia cinzento e as lágrimas caiam umas atrás das outras de forma incessante.

Escrevo hoje com a minha bebé arco-íris nos braços para recordar o meu Tomás. A dor melhora mas nunca desaparece e o Tomás está no meu coração todos os dias e nunca será esquecido. O meu filho mais velho.

No entanto, deixo uma mensagem de esperança a quem está neste momento a passar por algo semelhante. Melhores dias virão e os vossos corações serão eventualmente apaziguados. Os dias de sol eventualmente serão em maior número que os cinzentos. E nos nossos corações ficarão a memória e a saudade. Para sempre.

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Sílvia M.

Quando percebi a situação com a qual teria de lidar, senti a necessidade de procurar testemunhos para compreender, de algum modo, como me sentia e com o que estava a lidar.

Em março 2023 descobri que estava grávida do meu 4º filho. Foi uma gravidez inicialmente de risco tendo em conta que estava com descolamento do ovo. Repouso possível + progesterona. Na eco às 13 semanas estava tudo bem. Diagnóstico Pré-Natal também normal.

No início de Agosto, ao realizar a ecografia morfológica, percebemos que algo não estava bem com o funcionamento do coração do bebé. Nesse mesmo dia, realizei o ecocardiograma fetal que confirmou uma doença cardíaca congénita rara e de grau muito severo (1/10 000 bebés). Recebemos o gélido diagnóstico “incompatível com a vida”.

Como assim “incompatível com a vida”? O meu bebé de 20 semanas tinha uma vitalidade excelente, desenvolvia-se muito bem mas tinha um coração que só funcionava por estar ligado através da minha placenta… mesmo assim, não baixámos os braços e investigámos tanto… pedimos informação a equipas médicas portuguesas bem como a médicos internacionais peritos na patologia mas, infelizmente, não tínhamos as probabilidades a nosso favor.. repetimos mais 2 ecocardiogramas fetais e a evolução não era positiva, sem estabilidade.

No final de agosto, passámos por todo o processo do parto para nos despedirmos do nosso P. às 22 semanas. Pegámos nele ao colo, estivemos o tempo possível com ele (nunca é suficiente) e viemos para casa de braços vazios.

Depois deste grande desafio, surgiram outros bem difíceis, sendo um deles contar aos irmãos que o bebé tinha morrido por estar doente e que não iria voltar. É um grande desafio sermos bons pais quando temos o nosso coração partido… Ainda hoje falam sobre ele e em como gostariam que ele ainda estivesse na minha barriga. Acreditam que temos um anjinho a olhar por nós.

Lidar com o pós-parto de colo vazio é um dos maiores desafios psicologicamente e fisicamente. É um processo solitário dado que já não existe um bebé “a visitar”. Ver a barriga a regredir e mais tarde lidar com o regresso da menstruação que parece mais um murro no estômago… Contudo, a verdade é que, por mais difíceis e desafiantes estes momentos sejam, é importante lidarmos com eles porque nos ajudam no luto. Sinto que, ter dado espaço às emoções e lidado com tudo o que estava a sentir fisicamente, me ajudou no processo. Mas sim, não deixa de ser horrível.

Outro desafio, com o qual tenho lidado, é de facto a nossa cultura não saber lidar com o sofrimento. Os dias passam, as pessoas continuam as suas vidas e é como que nos seja exigido o mesmo. Como se o luto tivesse uma validade. Como se continuarmos tristes e em sofrimento já não fizesse sentido. Como se tivéssemos de voltar à “normalidade”. Para as outras pessoas sim, é a normalidade. Mas para nós… deixou de ser… e a verdade é que, grande parte das pessoas, não sabem lidar com o nosso sofrimento. Só não nos querem ver assim. Mas faz parte do caminho. E é/será durante o tempo que for necessário. Cada um tem o seu tempo de cura, de encontrar um novo sentido para a nova e difícil realidade. Não voltamos a ser a mesma pessoa. É inevitável. E há uma nova versão nossa que temos de conhecer e adaptar no dia-a dia. Na verdade, é uma fase em que estamos a sobreviver.

A quem esteja a lidar por esta difícil experiência, um grande abraço. Sigam o vosso coração e lidem com o vosso dia-a-dia conforme sentem que deve ser. Procurem ajuda mesmo que sintam que estão a “lidar bem” com o processo.

Um abraço

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Joana A.

Desde que me conheço que digo: tenho três sonhos na minha vida: casar, ir à Índia e ser mãe. Os dois primeiros já realizados e com a felicidade de poder dizer: realizados com o homem da minha vida.

Eu sou a Joana, tenho 33 anos e venho-vos contar a minha história! Porque todas as histórias aqui lidas me ajudaram e por isso sinto, que posso e devo ajudar outras mulheres e homens.

Em Outubro de 2022, decidimos que íamos ser pais. Um filho não se compra num supermercado, como sabiamente uma grande e querida amiga me disse uma vez. Por isso a decisão de ser pais, começa com a intenção de o ser, e esperar para ver, se a vida tem este capítulo escrito na história das nossas vidas, importa aqui saber, que sempre senti que este seria
o sonho que me traria algumas dificuldades em realizar. Nesta altura descobrimos que teríamos de esperar 6 meses, derivado de um contratempo. Chorei muito, mas acreditei que a espera me queria dizer alguma coisa.

Passados os seis meses, sem pressas e sem ansiedade, começámos as nossas tentativas. Em Junho de 2023, dia 14, descobrimos o nosso positivo! Muitos enjoos, impossibilidade de trabalhar, não conseguia perceber se estava feliz ou extremamente chateada por não conseguir
estar a usufruir da vida a crescer dentro de mim! O nosso filho! Fizemos a primeira ecografia às 7 semanas, ouvimos o coração forte e pela primeira vez uma luz muito grande invadiu todo o meu corpo. Os dias foram passando, contámos a muito poucas pessoas, os nossos pais souberam, pois eu vomitava dia e noite, e para tranquilizá-los contámos a verdade. A quem contámos, sempre dissemos: “calma, é muito cedo e pode não dar certo.” Dizíamos sempre isto, porque, na verdade, tínhamos os pés bem assentes na terra. Temos dentro do nosso círculo de amigos, amigos estes que são a família que escolhemos, que passaram por duas perdas gestacionais até terem o menino que tem sempre uma palavra bonita para nos dizer.

A história deles sempre me comoveu bastante, pela força, resiliência e o amor entre os dois. Quando fizemos as 12 semanas de gestação, senti que um peso me tinha saído de cima, e pensava, não perdi o meu filho, mas logo de seguida começou a ansiedade, será que está tudo bem? Tínhamos a ecografia marcada das 12 semanas, mas, nesse dia, foi greve dos médicos e
ficou remarcada para dois dias depois. Mas quis a vida que, nesse dia de manhã, tivesse um corrimento ligeiramente cor-de-rosa, que me deixou em alerta, e por tal motivo decidimos após o trabalho (enjoos tinham melhorado bastante por volta das 11 semanas), ir à urgência saber se
estava tudo bem.

No hospital, a médica (sempre querida), fez uma primeira análise e disse que não tinha sangue e o colo do útero estava fechadinho, mas que iriamos fazer na mesma uma eco. O meu coração acalmou. Ao deitar na maca e ao colocar o ecógrafo na minha barriga, não se via nada…comecei a tremer e a médica justificou que o ecógrafo da urgência não era o melhor do mundo, pelo que teríamos que fazer eco endovaginal. Quando começou, o ecrã virado para mim, percebi logo que o tamanho não seria de um bebé de 12 semanas e expressei isso mesmo.

Antes de me dizerem a mim alguma coisa, disse eu: “o bebé é muito pequeno para 12 semanas não é?” e a médica respondeu: “oh Joana, não tenho boas notícias, temos um bebé com medição de 9 semanas e 5 dias e não encontro batimentos”… não chorei, não disse nada, veio outra médica confirmar o que já tinha sido dito. Só pedi para o meu marido entrar e assim foi. Aborto retido. Não foi aborto espontâneo, como achei durante 12 semanas que poderia acontecer. Apenas nesse dia, muito já noite fora, é que chorei e comecei a questionar: mas porquê?

Fiz a medicação em casa para a expulsão. Os piores momentos da minha vida até ao dia de hoje. Muito sangue, muitas dores, e o momento que senti que era sem dúvida o saco gestacional, com o meu filho, a ser expulso. Grata ao mundo pelo homem maravilhoso que tenho ao meu lado que nunca me deixou desamparada. Se ele pudesse, eu sei, que sem hesitar
teria trocado comigo.

Passados 4 dias voltei ao hospital, ainda tinha restos ovulares, mas já sem o saco, sem o meu filho… fiz novamente medicação para ajudar a sair o restante e ajudou (mas pouco). Fomos de férias, para tentar ultrapassar o que nos tinha acontecido. Não era esquecer, porque nunca vamos esquecer que um ser me escolheu para ser casa durante 12 semanas, nos quais quase 10 o seu minúsculo coração bateu dentro de mim.

Infelizmente, quis a vida que os meus restos ovulares saíssem apenas quase 3 meses depois da notícia da perda. Foram longos 3 meses, com dores diárias, sangramento diário, e um tentar diário que tudo está bem e vai ficar bem. Nunca escondi a ninguém o que me aconteceu.

Sou a primeira a querer contar, e sei que é preciso coragem para tal. Mas precisamos de normalizar a perda. A gravidez está longe de ser igual às novelas, as histórias todas bonitas e românticas que vemos nos filmes. Uma em cada quatro mulheres que engravidam, passam por isto. Umas mais cedo, outras mais tarde, outras depois das 12 semanas e todas sofrem. Umas mais, outras menos, mas sofrem. Até as que escolhem interromper a gravidez por vontade própria. É um processo doloroso e está longe de ser normal, como nos querem fazer acreditar.

Vou ser eternamente grata, ao meu primeiro filho, por me ter ensinado tanto, mesmo sem nunca o ter sentido nos meus braços, no meu colo.
Agora, é seguir em frente e esperar por algo que sinto e sei: o meu filho vai voltar e eu vou tê-lo nos meus braços, ver crescer e ensinar-lhe todos os dias: com amor, tudo vale a pena!

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Zita

Olá!

O meu nome é Zita, perdi o meu bebé a 12 de maio de 2023 e este é o meu testemunho sobre diagnóstico de Trissomia 21.


A minha gravidez começou logo mal, quando, no primeiro ultrassom (5s), a médica me disse que eu tinha um descolamento de cerca de 70%, do saco gestacional, devido a um hematoma de origem desconhecida. Estive um mês e meio de repouso absoluto, a tomar progesterona e a repetir o ultrassom todas as semanas.

O hematoma foi desaparecendo e eu fui ganhando esperanças. Às 12 semanas, o hematoma desapareceu. Fiquei radiante e decidi aproveitar a minha gravidez.
Na semana a seguir, com 13 semanas, fui fazer a primeira eco e lembro-me perfeitamente do silêncio da sala depois da médica ter dito, com ar desolado: “Oh Zita …”

Segundos que pareceram horas até eu perguntar o que se passava. O meu bebé tinha líquido no crânio que ia até ao rabinho, como uma espécie de “bossa”.

Fiz a amniocentese no dia seguinte e depois de duas semanas angustiantes, veio o resultado. Trissomia 21 e problemas cardíacos.

Fiquei sem chão, mas a decisão estava tomada desde o primeiro dia de suspeita. No dia 12 de maio dei entrada na Maternidade, para fazer a interrupção da gravidez.

A decisão mais madura e difícil da minha vida. O dia mais desafiante e doloroso (a todos os níveis) da minha vida. Com 14 semanas, deixei o meu menino ir embora.

Não me fazia sentido colocar no Mundo uma criança assim. Sem sequer saber o grau, o meu pensamento era: quando eu morrer, quem cuida do meu amor? Então preferi sofrer eu.

Escrevo o meu testemunho porque vejo que se escreve muito sobre a perda na gravidez e após, mas a decisão de os deixar ir penso eu que fica um pouco esquecida…Só queria dizer a todas as mães que passam pelo mesmo que não estão sozinhas.

Apesar de tudo, só carrego boas memórias do meu menino. Guardei todas as fotos dos ultrassons que fiz. Tirei fotos da minha barriguinha.

Enquanto a tive (mesmo depois de saber o diagnóstico) mostrei-a orgulhosamente ao Mundo porque era o meu filho que ali estava. E na hora de o deixar ir sofri, chorei muito, dei muitas, muitas festinhas da barriga e disse-lhe Adeus.

Agora estaria com 7 meses. E isso dói.

Mas tudo passa…
Será sempre o meu primeiro filho.